A obsessão tradicionalista na maçonaria - Rampolla, Bugnini, S. João XXIII


Conteúdo de vídeo: https://youtu.be/JjoVj4G0BRs

Não é nem um pouco difícil encontrar por aí algum tradicionalista viciado em acusar os clérigos que bem desejar ter como maçons, e este artigo busca desmistificar algumas dessas calúnias, em especial ao Cardeal Rampolla, a São João XXIII e a Monsenhor Bugnini.

CARDEAL RAMPOLLA

O Cardeal Rampolla vem sendo acusado de maçom a muito tempo, alguns de seus acusadores aparentam não manter os justos limites da argumentação, como é o caso impressionante do Padre tradicionalista Gregory Hesse, que afirmou seguramente que o Cardeal Rampolla é maçom com o incrível argumento onde ele diz "meu tio, Monsenhor Hesse, me falou" (parece uma piada de mal gosto), eu poderia revidar dizendo "meu bisavô me contou o contrário", isso claro, para entender a irrelevância de tal testemunho.

Os rumores de que o Cardeal Rampolla seria maçom começaram no ano de 1929 (levando em consideração que o Cardeal morreu em 1913). Os principais argumentos da oposição (ignorando o "meu tio me falou") estão focados em testemunhos isolados e no veto do imperador austríaco, que teria impedido a sua eleição como Papa, no conclave que ao final de tudo elegeu São Pio X. Esse argumento é insustentável, mesmo por falta de motivação, afinal, por que o Imperador Francisco José I da Áustria, que nunca foi considerado o modelo de monarca católico anti-maçom, iria vetar um cardeal por suspeitar que ele fosse maçom (mesmo grupo que cercava a vida e influência do imperador)? É mais fácil acreditar que o Cardeal Rampolla teria sido vetado pelo imperador por causa de seu caráter anti-maçonico, uma vez que Rampolla, como secretário de estado de Leão XIII, emitiu 41 documentos contra a maçonaria.

Já os testemunhos tardios simplesmente não tem credibilidade ou confirmação dos próprios Bispos que dizem acusar Rampolla, cabe portanto aos acusadores provar sua credibilidade.

SÃO JOÃO XXIII

Sobre este assunto, eu já escrevi em nossa aba comunidade do YouTube, portanto estarei deixando o texto abaixo, e completando ele com outras informações importantes:

Uma epidemia muito estranha é compartilhada entre os tradicionalistas e os maçons, trata-se de acusar, custe o que custar, os Papas de participantes da maçonaria, acusam o Papa Francisco, São João Paulo II, São Paulo VI (o caso dele chega até a ser engraçado, me recordo de uma das supostas listas vazadas de maçons no clero que usam para acusar São Paulo VI, na mesma lista o nome de Marcel Lefebvre também está presente), e claro, também acusam São João XXIII (alguns chegam a acusar ate o Beato Pio IX). Para isso buscam os mais obscuros artifícios, e em minhas pesquisas percebi a falta de fontes primárias nessa pseudo-argumentação. Usam de uma suposta oração maçonica completamente apócrifa, acompanhada de outra oração pelos judeus, igualmente apócrifa. Vocês podem verificar sobre o assunto nos seguintes links:


José Castellani, que foi iniciado na maçonaria, escreve sobre o assunto:
Na época [da publicação das orações] --- eu já era iniciado --- houve o maior oba-oba entre os maçons, como se aquilo fosse um enorme galardão. Mas o balde de água fria veio, em 1967, quando se descobriu que as três orações ERAM APÓCRIFAS, ou seja, FALSAS, escritas por outra pessoa, em nome do papa, que já havia falecido em 1963, três anos antes da publicação. Isso foi PROVADO, mas ainda habitou as publicações maçônicas por mais uns quatro anos, desaparecendo no início da década de 70. Lamento, apenas, que essa farsa tenha sido revivida, há pouco, por um Grão-Mestre do Grande Oriente Paulista, o qual influenciou um obreiro do GO de São Paulo, fazendo com que este publicasse a patranha no Boletim Oficial, sem qualquer pesquisa e sem procurar se inteirar da verdade dos fatos. Quando será que os maçons vão aprender a não acreditar em histórias da carochinha, sem um mínimo de pesquisa?
Créditos às pesquisas sobre as orações a Nelson Sarmento


Depois disso, ainda usam de fotos que teriam supostamente sido tiradas com maçons, onde dificilmente se vê uma fonte comprovando que realmente era o caso, tentam até, num último esforço, conciliar os seus ensinamentos com a maçonaria. Francamente, isso é uma obsessão.

Por ocasião da concordata de Latrão (em 1929) o até então Giuseppe Roncalli escreveu: «O Senhor seja louvado! Tudo o que a Maçonaria, isto é, o Diabo, empreendeu durante sessenta anos contra a Igreja e o Papa na Itália foi reduzido a nada.»

E o seu secretário, Loris F. Capovilla, talvez uma das maiores autoridades sobre a vida de São João XXIII, explica sobre o assunto:
O Papa, sobre as felicitações que os maçons o davam, escreveu: “Agradeçam as corteses felicitações, mas não quero nenhum compromisso verbal com a Maçonaria e similares”. João XXIII também escrveu uma nota manuscrita de 1962, com o título, repetindo duas vezes em tinta vermelha e preta, as condenações Papais contra Maçonaria. Do Dictionnaire Apologétique de la Foi Catholique, o Papa transcreveu as solenes condenações sobre este assunto proferidas por seus predecessores. [ Após isso, Capovilla é questionado se o Papa tinha intenções de entender a maçonaria, e se tinha alguma intenção de reverter as censuras da Igreja à maçonaria, ao que ele responde: ] Eu explico o significado disso com cautela: A cortesia [de João XXIII] nunca significou ceder. Reunir-se e discutir nunca será equivalente a compromissos e atenuações em relação às condenações da Maçonaria como são hoje. (Juan XXIII: En el recuerdo de su secretario Loris F. Capovilla, Página 81)


MONSENHOR BUGNINI

Chegamos ao momento tão esperado, o caso de Monsenhor Bugnini, acusado por todos os lados de ser um maçom deformador da liturgia da Igreja.

Durante sua vida, ele tomou consciência destas acusações, por isso escreveu ao Papa São Paulo VI:

Nunca tive nenhum interesse pela Maçonaria; não sei o que é, o que faz ou quais são seus propósitos. Vivo como religioso há cinquenta anos, como sacerdote há quarenta; por vinte e seis, minha vida se limitou à escola, casa e escritório, e por onze, apenas em casa e no escritório. Nasci pobre e vivo como pobre [...] Quem se interessar pode saber que durante onze anos viajo de e para o meu escritório de transporte público. Vivo na minha comunidade, em dois quartos pequenos, que mal contêm o que para mim são as necessidades da vida. (Carta de Annibale Bugnini ao Papa Paulo VI, 22 de outubro de 1975)

E em sua obra "a reforma litúrgica" ele escreve:

Mas para ele e seus colegas, caluniadores de profissão (que triste, que também um bispo [Marcel Lefebvre] se entregue a intrigas tão miseráveis ​​contra um colega bispo!), repito o que escrevi [ao Papa] em 1976: "Não possuo nada neste mundo mais precioso do que a cruz peitoral: se alguém é capaz de provar, honesta e objetivamente, um pingo de verdade do que eles afirmam, estou pronto para devolver a cruz peitoral. (Annibale Bugnini - A Reforma Litúrgica)

Alguns tradicionalistas alegam como prova contra o Arcebispo Bugnini o suposto exílio que ele teria sofrido por parte do Papa Paulo VI. Em que consistiu o exílio? Em ser representante do Papa no Irã (o que na prática deveria ser tido como argumento a favor da confiança que o Papa mantinha nele). A verdade é que faltam provas definitivas da parte dos tradicionalistas para alegar uma pertença de Monsenhor Bugnini à maçonaria.


OS EFEITOS DAS ACUSAÇÕES

Depois de tudo que já vimos, acho conveniente fazer uma análise sobre a forma das acusações tradicionalistas, pois podemos perceber um padrão muito claro, eles sempre usam:

(1) Uma citação de um livro obscuro. (2) Uma teoria baseada em presunção. (3) um testemunho duvidoso.

É com base nestes princípios que nós vamos inverter o jogo, e mostrar que ao argumentar de forma tão porca, os tradicionalistas também poderiam tornar Marvel Lefebvre, falecido bispo tradicionalista, um "maçom evidente".

Mas antes de começar a análise, acho que cabe deixa claro que algumas pessoas acusam, de forma "mais justa" o bispo Lefebvre de ensinar doutrinas maçônicas (não necessariamente de ser maçom), como é o caso de John Sauza, que frequentou capelas da FSSPX durante anos e teve seu livro (Tur pra False Pope) divulgados pelo clero da SPX; mas que recentemente abandonou a seita e abraçou a comunhão com Roma (não estamos aqui para julgar até onde a conversão dele foi legítima, essa não é a questão), ele escreve em um de seus artigos sobre colegialidade:

Com efeito, é a FSSPX, e não o Concílio Vaticano II, que rejeita o ensinamento de Pio XII sobre de onde vem a jurisdição (“o poder de jurisdição vem do Sumo Pontífice para os bispos”), em favor da doutrina maçônica (condenada pelo Papa Leão XIII) que o povo autoriza os bispos a agir, porque o povo tem “direito” aos sacramentos.
       Sabendo que não tinha uma missão jurídica exigida pela lei divina, Lefebvre abraçou plenamente essa doutrina maçônica ao afirmar que o bispo recém-consagrado “não tem outra base de jurisdição senão aquela que vem dos pedidos dos sacerdotes e dos fiéis para cuidar de suas almas e as de seus filhos, e que lhe pediram para aceitar o episcopado…” [Fonte] Incrivelmente, Lefebvre também disse: «Como a jurisdição do bispo não é territorial, mas pessoal e tem como fonte o dever dos fiéis de salvar suas almas, se um grupo de fiéis da diocese convida o bispo a ter um sacerdote, esse grupo dá por isso mesmo , autoridade ao bispo para zelar pela transmissão da fé e da graça neste grupo, por intermédio do padre que ele enviou.» [Fonte] O bispo Tissier repetiu publicamente este erro flagrante de Lefebvre ao afirmar que a jurisdição da Sociedade vem do povo. Diz Tissier: “ Na medida em que você não se recusa a receber de seus sacerdotes o ministério que eles têm o direito de exercer para o seu bem, ou seja, para o bem da Igreja, que a jurisdição que você de certa forma lhes der poderão ser exercidos frutuosamente”. [Fonte]
Feito isso, vamos apresentar finalmente como a forma tradicionalista de argumentar pode se voltar contra eles.

1- Citação de um livro obscuro

O livro “Holy Blood, Holy Grail” (que acusa São João XXIII de ser um grão-mestre da instituição maçônica do Priorado de Sião) acusa em duas páginas 211-214, 224 o bispo Lefebvre de ser maçom, membro do Priorado de Sião.

(Lembrando, este livro é completamente obscuro, e defende teses horríveis, como a de que Nosso Senhor teria uma descendência biológica, apenas estamos usando para exemplificar o absurdo da argumentação tradicionalista)

2- Uma teoria baseada em presunção

O fato é que Lefebvre optou por estabelecer a sede da FSSPX na vila de Écône, que fica a uma curta distância da vila de Sion (onde está a sé do Priorado de Sião) seria isso mera coincidência?

Além disso, a FSSPX chama suas capelas de “priorados”, termo mais apropriado para ordens de cavalaria, e que é usado pelo Priorado de Sião.

3- Um testemunho duvidoso

Christopher Sparks, testemunha em 29 de janeiro de 1997, que quando era seminarista da FSSPX, um ocorrido na 5ª semana após a Páscoa, Ano 1972, o surpreendeu, eis o que ele escreve:

Houve uma procissão através de Êcone e Sion, partindo do seminário. Uma banda maçônica formada na frente liderou toda a procissão. Muito perturbador! Eu estava em procissão, muito desconfortável. Nunca ouvi falar de tal coisa. Mais tarde, de volta aos EUA na TV, vi outras procissões européias lideradas por bandas. Por que? Por que uma banda? Tocando música de banda. Por que? As procissões são lideradas pelo Crucifixo, não por uma banda de 15 membros! [...] de qualquer forma, eu perguntei às pessoas na procissão "o que está acontecendo aqui?" Todos disseram que é a banda maçônica de Sion. Lefebvre é um maçom, tudo bem.
Feito isso, já temos uma teoria sedevacantista perfeita! Obviamente não não defendemos essa barbaridade, apenas estou usando para exemplificar a incompetência destes argumentos tão simplórios e maleáveis.
É tão verdade que as teorias tradicionalistas se comportam assim, que eu tirei essas fontes de sites tradicionlistas, que confiam ou suspendem juízo sobre o assunto.

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