O canôn 9 do Concílio de Trento e o Missal de Paulo VI
Conteúdo de vídeo: https://youtu.be/OJKrZfzHEEg
É muito comum de se ver tradicionalistas defenderem a ilicitude do Novus Ordo com base em canônes do Concílio de Trento, mas o caso que iremos tratar hoje não parece ser um ponto comum entre eles, é inclusive improvável que algum sedevacantista ou mesmo um tradicionalista mais sério vá usar deste argumento.
O CâNON, E COMO ELE ESTÁ SENDO USADO
O canôn construi no seguinte:
«Se alguém disser que o rito da Igreja Romana que prescreve que parte do Cânon e as palavras da consagração se profiram em voz submissa, se deve condenar, ou que a Missa se deve celebrar somente em língua vulgar, ou que não se deve lançar água no cálice ao oferecê-lo, por ser contra a instituição de Cristo - seja anátema». (Concílio de Trento, sessão 22, Cânon 9)
Alguns tradicionalistas costumam usá-lo como uma espécie de bode espiatório quando questionados sobre cânones do mesmo concílio que são usados em defesa da Missa Nova.
É como dizer “veja bem, você está me falando que eu preciso aceitar à missa nova com base no Concílio de Trento, mas o mesmo concílio condena a missa nova, então temos que encontrar uma solução à parte”
E também existem aqueles que simplesmente usam para tentar persuadir algum coitado que desconhece do assunto a aderir à tese tradicionalista
A LEGÍTIMA INTERPRETAÇÃO DO CÂNON
Em primeiro lugar, é bom lembrar que as palavras da consagração na Missa nova não são obrigatóriamente ditas em voz alta, ninguém fala que se deve "condenar dizer em voz baixa" não há rúbricas para isso.
Para buscar uma interpretação legítimo do cânon de Trento, eu invoco aqui a autoridade de São Roberto Belarmino, doutor da Igreja e Santo pós concílio de Trento:
«Não negamos que as palavras da consagração na Igreja do Oriente são habitualmente recitadas em voz alta, pois é bastante certo pela liturgia de [São João] Crisóstomo. Nem condenamos isso; pois não afirmamos que essas palavras devam necessariamente ser recitadas em voz baixa, mas que a Igreja é livre para estabelecer o rito e, portanto, nem o rito dos gregos nem dos latinos pode ser condenado, nem deveria.»
(São Roberto Belarmino - Sobre o Santíssimo Sacrifício da Missa, cap.12)
Um pouco antes, no mesmo capítulo, São Roberto Belarmino trata de uma interpretação adequada do cânon no que cabe às palavras da consagração em voz submissa:
«Nossos adversários impugnam a Igreja Latina porque ela ordena que muitas coisas na Missa sejam ditas em voz baixa, que foi abordada no Concílio de Trento, Sessão 22 cânon 9. Ali, desde o início, deve-se observar que a questão não é: “Se é lícito per se celebrar toda a Missa em voz baixa”, pois não ignoramos que o modo de voz não pertence à substância do sacrifício, e essas coisas podem ser mudadas de acordo com o julgamento da Igreja. Assim, toda a questão é colocada nisto: “Se o costume da Igreja latina de pronunciar certas coisas em voz baixa se opõe à instituição de Cristo e, portanto, é ruim e necessariamente deve ser corrigido» (ibidem)
Quanto à língua vernácula, também não há nenhuma rúbrica no novus ordo que proíba o latim de alguma forma, muito pelo contrário, o uso do latim é uma maneira lícita de se administrar os sacramentos, conforme se diz no código de direito canônico:
«Realize-se a celebração eucarística na língua latina ou em outra língua, contanto que os textos litúrgicos estejam legitimamente aprovados.» (Cân.928)
Agora, olhando para o passado, assim estabelece o venerável Papa Pio XII, último Papa pré-conciliar:
«Em muitos ritos o uso da língua vulgar pode ser assaz útil para o povo, mas somente a Sé Apostólica tem o poder de concedê-lo, e por isso, neste campo, nada é lícito fazer sem o seu juízo e a sua aprovação, porque, como havíamos dito, a regulamentação da sagrada liturgia é de sua exclusiva competência.»
(Pio XII - Mediator Dei, art.53)
Além das liturgias orientais, o vernáculo já foi usado após o Concílio de Trento e pré Concílio Vaticano II também no próprio rito romano.
Em 1624, Urbano VIII permitiu que os Carmelitas traduzissem o Missal para o árabe, para os novos convertidos católicos na Pérsia. Em 1615, Paulo V permitiu por decreto que o rito romano pudesse ser traduzido em Mandarim.
O resto do texto do cânon de Trento não pode ser usado para fazer alegoria a nada no Missal de São Paulo VI.
Podemos ver claramente que não se pode levar qualquer consideração de validade nesse argumento.
E para terminar, me despeço com um cânon do Concílio de Trento:
«Se alguém disser que as cerimônias, vestes e sinais exteriores que a Igreja católica usa na celebração das missas, são antes estimulantes da
impiedade do que deveres da piedade - seja anátema.»
(Concílio de Trento - Sessão 22, Cân.7)
Onde eu posso achar fontes que dizem que os Papas Urbano VIII e Paulo V aprovaram a tradução dos missais para linguas vernaculas?
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